Pesquisar este blog

30/07/2010

Distropia



FIM
(Relato do Dr. Karnot sobre uma entrevista com Saíjd Irazés)


            "Me esqueço às vezes, sinto muito. Que vocês não podem entender está agora bem claro para mim. A entrevista com Irazés começou bastante estranha, como vocês bem podem entender por quê...

            Ouvi uma batida na porta de meu consultório. Não uma batida normal, na qual se ouve uma pancada seca e logo após o som ecoando. Era diferente: o eco começava baixo e depois aumentava, morrendo numa batida seca. Foram três batidas.Saíjd Irazés entrou e se dirigiu a mim. Eram 18:20 em ponto, Irazés era bem pontual!

            - Bela auro... pôr do sol, não acha, Dr. Karnot?

            - Ah sim! - olho pela janela. - Belíssimo!

            Sentou-se numa poltrona, eu o acompanhei sentando-me em outra à frente. Ele repete:

            - Bela aurora, não acha Dr. Karnot?

            Nada respondi, sabia que ele não esperava uma resposta naquele momento. Isto fazia parte de nosso código. Tratei de iniciar logo aquela entrevista:

            - Bom, comecemos então aquela conversa que combinamos.

            - Que vamos combinar! Quer dizer... Sim! Que combinamos.
           
            -Como?

            Irazés completa:

            - Me desculpe, doutor. Sempre me esqueço... Para você já foi combinado. Para mim é algo que ainda preciso lembrar de fazer mais tarde para que tudo isto que está acontecendo agora faça algum sentido para nós dois. Passaram-se tantas semanas e eu ainda não consegui me acostumar completamente com esta minha situação...

            Irazés parecia já impaciente, talvez confuso. Difícil explicar. Lembrei então de cumprir minha parte do diálogo, naquele código que havíamos combinado em seguir para que pudéssemos manter uma conversa com um mínimo de coerência:

            - Como?
           
            - Que vamos combinar!

            Entendendo a deixa, completei:

            - Bom, Saíjd... Vamos então começar aquela conversa que combinamos.

            - Me chame de Irazés, por favor!

            - Bom, Saíjd... Vamos então começar aquela conversa que combinamos.

            Era estranho começar uma entrevista que para Irazés estava acabando naquele exato momento! Mas sabendo que especulações não levariam a lugar algum, resolvi prosseguir como roteiro planejado.

            - Vamos respeitar então aquele formato de diálogo combinado, não é mesmo ?

            - Sim, doutor. Acho mais justo desta forma, para que a conversa tenha coerência para nós dois, ainda que o preço disto seja ficar redundante.

            - Por mim está excelente, isto não me incomoda.

            - Sim, me parece justo que a conversa fique coerente para ambos, ainda que possa ficar redundante.

            - Certo! Vamos seguir então aquele formato de diálogo bidirecional que combinamos, não é?

            Antes de continuar este curioso relato, permitam-me que eu me apresente. Sou o Dr. James Karnot, psiquiatra. Não, minha profissão nada tem a ver com esta estranha conversa com Saíjd Irazés que estou agora reproduzindo para vocês. Ele não é louco. Muito pelo contrário, é uma pessoa completamente lúcida, e de uma inteligência incomum! Se o diálogo pareceu até o momento sem muito nexo, a culpa é da situação extremamente singular na qual ele se encontra agora. É que a visão que ele tem deste mundo é diferente, radicalmente diferente daquela que todos nós costumamos ter, e me interessou muito como psiquiatra entender os artifícios e mecanismos de raciocínio que ele desenvolveu para se adaptar tão bem à situação, a tentar viver tão normalmente quanto fosse possível para ele com o resto do mundo, com as pessoas 'normais'.

            Confesso que ele me pareceu louco a princípio, e foi o que me levou até ele. Mas ficou claro com o tempo que tudo aquilo que ele descrevia não era produto de uma mente desequilibrada, e sim descrições fiéis das coisas como ele realmente as observava. A ciência se sustenta em provas, e... por incrível que pareça, Irazés podia demonstrar experimentalmente todo aquele mundo maluco 'criado' por sua mente. Não se podem questionar provas científicas, que podem ser repetidas e medidas a qualquer momento e sempre apresentam o mesmo resultado, concordam?

            -Mil perdões, doutor!!! Sempre me esqueço deste detalhe nutricional!

            -De quê você está se desculpando? Você não fez nada!

            -Ah sim, que cabeça... Nada fiz, mas vou fazer. Estes petiscos estavam irresistíveis! É que para mim eu já fiz, e minha educação me obriga a este pedido de desculpas, pois imagino que a cena não vai ser das mais agradáveis. Esqueça isto por enquanto, doutor. O senhor vai entender logo...

            É neste momento que presencio algo bastante repugnante a meus olhos, que eu ainda não estava preparado para ver. Sabia do fato, mas ainda não era a hora de entrar em contato direto com ele. Era por isto que Irazés nunca comia em público, ninguém entenderia! Mas o erro foi todo meu... Explico: deixara inocentemente um pote com petiscos e guloseimas numa mesa baixa entre as duas poltronas, para deixar aquela entrevista mais descontraída. A intenção foi boa, mas de boas intenções o inferno está cheio, e Irazés acabou caindo nesta arapuca involuntária.Inicialmente fez uma cara de surpresa. A seguir começou a mastigar algo, vindo nem me perguntem de onde! Bom, vamos deixar de lado estes rodeios todos e sejamos científicos: Irazés começou a ruminar algo que veio de seu estômago! Mastigou várias vezes, levou a mão à boca e tirou dela um punhado de amendoins inteiros, que despejou sobre um dos potes de petiscos que estava na mesa de centro.

            -De quê se desculpa, se não fez nada? - repeti, só para cumprir o protocolo do diálogo.

            - Desculpas? De quê??? Ah sim, é de algo que vou fazer daqui a pouco...

            Não sei como aconteceu, e muito menos Irazés. Era algo difícil de acreditar, talvez até impossível se as evidências do fato não fossem tão abundantes e tão gritantes: Irazés vivia 'ao contrário'!!! O tempo para ele não corria como corre para todo mundo, vindo do passado, passando pelo presente e se encaminhando para o futuro. Nada disso!! Irazés era uma prova viva de uma criatura que desrespeitava completamente a segunda lei da termodinâmica. Mais que desrespeitar, ele vivia exatamente da maneira oposta àquela que tal lei ditava! A entropia, ou nível de ordem molecular, para ele não diminuia com o passar do tempo, mas aumentava! Enquanto para todos os seres humanos, todos os planetas, todas as estrelas, todas as galáxias, etc... a desordem aumentava com o passar do tempo, para Irazés o que aumentava era a ordem! Quer dizer, isto no nosso ponto de vista. Como tinha de ser, o raciocínio e a percepção de Irazés seguia o sentido da diminuição da entropia, como acontece com todo mundo. Mas para ele, diminuir a entropia significava que a ‘seta do tempo’ precisava apontar para o passado, e não para o futuro! O que era o meu futuro naquela entrevista, por exemplo, Irazés já havia presenciado. E o que estava no meu passado, ele ainda não tinha como conhecer, pois tais eventos pertenciam ao futuro dele!

            - Este protocolo que você criou de diálogo bidirecional, quando surgiu?

            - Doutor, pensei muito, queimei muitos neurônios tentando bolar uma forma eficiente de conseguir me comunicar com o resto do mundo do jeito mais natural possível. A única conclusão a que cheguei foi esta que estamos usando agora. Isto eu desenvolvi recentemente, faz umas duas semanas, pouco antes da nossa primeira entrevista, que aconteceu em... Ah, me desculpe, mas para o senhor ainda não aconteceu!

            - De fato, e nem precisa me dizer quanto vai acontecer. Combinamos não revelar os futuros um do outro, não é?

            - Sim, eu não lhe revelo seu futuro, que eu já sei qual vai ser, e o senhor também não me dá informação alguma de meu futuro, que está no seu passado.

            - De fato, e nem precisa me dizer quanto vai acontecer. Combinamos não revelar o futuro de cada um, não é?

            - Doutor, pensei muito, queimei muitos neurônios tentando bolar uma forma eficiente de conseguir me comunicar com o resto do mundo do jeito mais natural possível...Num diálogo normal, em que os dois interlocutores seguem a mesma linha de tempo, a fórmula pergunta-resposta, pergunta-resposta, pergunta-resposta é válida. Mas entenda o meu problema: minha linha do tempo corre numa direção contrária à sua, e de todas as outras pessoas do meu convívio. Quando me fazem uma pergunta qualquer, não adianta ficar esperando uma resposta porque para mim esta pergunta está no futuro, ela nunca aconteceu! Mas se eu responder e você repetir esta mesma pergunta após a minha resposta, sua pergunta estará agora no conjunto de meus eventos passados, e só assim eu serei capaz de respondê-la. Pode parecer uma chatice ter de repetir uma frase que já foi enunciada, mas como eu também me comprometo a seguir o mesmo protocolo, ou seja, repetir a minha pergunta assim que meu interlocutor completa sua resposta, me parece um acordo bastante justo. Ops! quase cometo um deslize! Isto ainda não aconteceu para o senhor... Isto aconteceu em... Eu o desenvolvi a cerca de duas semanas apenas, pouco antes de nossa primeira entrevista.

            - Quando surgiu este seu protocolo de diálogo bidirecional? - repeti apenas para que ele me desse a resposta anterior...

            Muito me intrigava este estranho nome do meu entrevistado: Saíjd Irazés!

            - Qual é a origem deste nome? Irazés me lembra algo árabe, mas não parece que você seja descendente...

            - Sou cem porcento brasileiro, doutor. Pelo menos até onde conheço minha ascendência.
           
            - Este nome estão, de onde veio?

            - Foi muito difícil me adaptar ao mundo nestas condições tão estranhas! Uma das minhas maiores dificuldades depois do período de choque, quando decidi sair da ostra em que fiquei fechado algum tempo e tentei encarar este mundo que para mim corria de trás para a frente (embora sabendo que eu é que era o diferente nesta história toda!), o mais difícil foi aprender a entender e pronunciar as frases ao contrário! Sim, pois se eu quisesse ter alguma chance de compreender e ser compreendido pelas outras pessoas, eu teria que aprender a fazer isto! Falar de trás para a frente até que nem foi tão difícil. Muito mais difícil foi aprender a falar inspirando ar, ao invés de expelir!

            - E seu nome, onde entra nesta história toda?

            - É que neste mundo maluco em que eu estava vivendo, pelo menos uma coisa eu queria que me soasse mais familiar. E era uma coisa muito importante: meu nome! Foi por isto que o troquei: tudo bem precisar falar e ouvir frases ao contrário, me esforçar para entendê-las. Mas se tivesse que passar por isto pelo resto de minha vida, pelo menos meu nome eu gostaria de ouvir como eu sempre tinha ouvido!

            - E seu nome é? Acredita que nunca te perguntei isto?! Sempre achei que fosse Irazés mesmo...

            - Saíjd Irazés é César Dias, com os fonemas pronunciados de trás para frente. É meu nome: César... Irazés!

            - E seu nome é? - bom, vou poupá-los aqui da repetição, mas o restante desta parte do diálogo prosseguiu no protocolo bidirecional que vocês já devem ter compreendido.

            Lembrei Irazés, digo, César (estou tão acostumado, vai ser difícil pensar em Irazés como César agora...) de comparecer amanhã (na verdade, ontem) à próxima entrevista. Ela seria muito importante, uma possibilidade de tentar reverter a situação pela qual ele passava agora. Na verdade, tudo já havia sido feito, só que ele não sabia ainda: eram coisas que ele ainda iria fazer!!! Ele fará tudo isto ontem! Mas eu precisava lembrá-lo disto:

            - Não se esqueça de me telefonar ontem combinando esta entrevista, ok?

            Irazés tira um bloco de notas e uma caneta de seu bolso. Abre numa página e, à medida em que ele faz uma anotação escrevendo da direita para a esquerda, os traços no papel que estavam embaixo da ponta da caneta vão sumindo: era a tinta saindo do papel e voltando à carga da esferográfica, à medida em que Irazés 'desanotava' meu aviso. Guarda então o bloco de notas no bolso, e eu completo:

            - Não se esqueça de me telefonar ontem marcando esta entrevista, tudo bem?

            Irazés se levanta da poltrona e me cumprimenta.

            - Boa tarde, doutor! Espero ter chegado a tempo!

            Após um instante de confusão, completa:

            -Tchau!

            Acompanho Irazés até a porta do consultório, onde ele se dirige andando para trás. Só então percebo um ferimento em sua cabeça. Estava cicatrizado antes, me lembro! Mas agora ele parecia bem recente! Ele sai, fecho a porta, e ouço batidas. Mas sei que não devo atenter. Na verdade, já atendi. Me dirijo à janela e, lá embaixo, vejo Irazés saindo da clínica. Agora anda normalmente para a frente, pois em público ele faz de tudo para parecer o mais normal possível. Mas percebo que seus passos são cautelosos, pois do seu ponto de vista ele na verdade está andando para trás! Pára de repente, olha indignado um poste à sua frente. Ouço um grito, 'Iiiááááá!!!', e vejo Irazés bater sua testa no poste! O corte que estava sangrando se fecha, e ele prossegue caminhando.

            Fim da entrevista,olho para o relógio: agora são exatamente 18 horas em ponto!!"

           
            Eis o estranho relato do Dr. Karnot! Mas apesar desta estranha forma de Irazés ver o mundo, tudo continuava como sempre foi no resto do Universo. Apenas para ele as coisas pareciam diferentes, ninguém ainda conseguia explicar o por quê! Os planetas continuavam girando em suas órbitas, as galáxias continuavam rodopiando em torno dos buracos negros que existiam em seus centros. Tudo continuava igual! Qualquer que fosse a galáxia distante do universo para a qual você apontasse seu espectrômetro, veria que quanto mais distante ela estivesse maior seria o desvio para o azul que você obteria em seu espectro luminoso. Hubble ainda vai explicar isto no começo do século XX, e saberemos que isto acontece porque nosso universo está se contraindo.

            Tudo continua igual! As galáxias continuam se aproximando cada vez mais, ficando mais densas, em direção a um ponto central. Isto continuaria até chegar aquele momento de singularidade máxima que vai acontecer daqui a alguns bilhões de anos, e que será chamado de Big Crunch!!

SAÍJD IRAZÉS MÔC ATSÍVERITNE


29/07/2010

Este chão que nos sustenta...

(esboço: parte 1)



    Hoje acordei no teto de meu quarto. Quisera eu explicar o que fazia lá, mas não podia. Os móveis se empilhavam no teto em completo caos. Não havia explicação para aquela situação tão inusitada, exceto a de que eu não havia ainda despertado de um estranho pesadelo. E foi com isto em mente que fechei os olhos e tentei adormecer de novo, esperando por uma segunda chance de despertar no meu mundo normal.
    Foi inútil! Abri novamente os olhos e o caos era o mesmo. Havia feito uma noite fria, e foi o volume das cobertas que me protegeram do desconforto do chão frio que poderia ter me despertado durante a madrugada. Ou melhor, do teto frio.
    Sobre mim estava um colchão, felizmente leve, e sobre o colchão estava  a cama, de cabeça para baixo. Felizmente a cabeceira era alta, o que me impediu de ser esmagado por ela. Saí debaixo dela para olhar ao redor. O guarda-roupas tombado à minha frente, a escrivaninha sobre ele, com todos os livros espalhados sobre o que, até a noite anterior, era o meu teto. O criado-mudo obstruindo a parte superior da porta. Ou seria melhor dizer agora, a parte inferior? Nada mais fazia sentido.
    Pela fresta da janela via que lá fora já havia amanhecido. Precisava me levantar, encontrar alguém, descobrir o que estava acontecendo. Teria enlouquecido? Não podia ser, me sentia plenamente lúcido. Mas talvez todos os loucos também se sintam plenamente lúcidos dentro de sua loucura.
   Tentei acender a luz para observar com mais cuidado a situação, afastando a penumbra em que agora se encontrava o cômodo. O interruptor se encontrava um pouco mais alto que de costume, mas consegui alcançá-lo. Porém em vão, pois a lâmpada, atarrachada no chão à minha frente, não acendeu. Percebi também que não estava ligado o rádio-relógio que ainda pendia na parede lateral, pendurado na tomada. Fui até a janela na intenção de abri-la, acreditando que talvez um pouco mais de ar, junto com a claridade, pudesse esclarecer de vez aquela situação absurda. Foi impossível, ela estava emperrada. Podia ver apenas parte do chão do quintal já bem iluminado olhando para cima, pelas frestas da janela. Olhei para o relógio, que havia encontrado em meio à bagunça que se acumulava pelo teto. Eram sete horas da manhã.
    O quarto se encontrava na parte superior da casa (agora inferior) e era o único cômodo com janelas naquele pavimento. Com a janela emperrada, que não cedia apesar de todos os meus esforços, teria se descer (ou seria agora subir?) ao térreo da casa para ter acesso ao exterior. Saí pela porta do quarto em direção ao teto do corredor. Virei para as escadas e só então descobri que, naquela situação tão inusitada, não seria fácil o acesso ao antigo pavimento térreo! Do ponto de vista no qual eu agora observava o mundo, o acesso ao teto do pavimento térreo era muito alto, não conseguiria escalar até ele sem ajuda. Felizmente havia a escrivaninha no quarto, que poderia usar como apoio. Estranho, ela parecia bem mais leve do que eu sempre supus que ela fosse! A levei até o teto da escadaria, encostei na parede e, com este apoio, consegui subir até o teto do pavimento térreo da casa.
    Fui à sala de estar, e a situação de caos era ainda pior. Sofá e poltronas, mesa e cadeiras jogados pelo teto, bem como a TV, DVD, aparelho de som, discos... Era estranho eu não ter despertado com o barulho que deveria ter sido produzido com esta confusão toda, até perceber que apesar da bagunça absolutamente nada havia sido quebrado. Parecia ter sido tudo colocado em suas novas posições aleatórias com cuidado, sem causar danos. A propósito, se eu próprio tivesse "despencado" de repente do chão do meu quarto para o teto certamente teria despertado. Só consegui chegar então à conclusão de que, o que quer que tenha acontecido, foi bem suave e silencioso a ponto de não me interromper o sono.
    Aquilo só podia ser uma brincadeira. Muito bem elaborada, e ao mesmo tempo de muito mal gosto, mas tinha de ser esta a explicação! Eu estava muito curioso em descobrir com que arte de engenharia alguém teria conseguido, da noite para o dia, colocar uma casa inteira de pernas para o ar e, mais que isto, com o seu ocupante dentro, dormindo tranquilamente e sem ter a mínima noção do que acontecias ao seu redor! Precisava sair da casa, certamente para encontrar lá fora um monte de rostos gargalhando da minha cara de espanto diante daquele trote de gosto tão discutível. E também para ir atrás do responsável pela brincadeira, saber como ele colocaria minha casa de volta no lugar ou ressarciria meus prejuízos. Mas primeiro precisava encontrar as chaves da porta. Na noite anterior eu as havia deixado sobre a TV, ao lado do aparelho de som. Mas agora a TV estava no teto, com o som sobre ela, então onde estariam as chave?
    Demorou, mas encontrei. Perdi cerca de meia hora com isto. Sim, era hora de sair e encarar os responsáveis pela brincadeira. Abri a porta principal da casa e pulei para fora, disposto a por as mãos no pescoço do primeiro engraçadinho que aparecesse na minha frente mas... Deus do céu, não havia chão!!!! E se não ajo rápido, não consigo me agarrar ao que restou no madeiramento do antigo telhado da casa! Abaixo de mim a visão era vertiginosa, apenas uma imensidão azul se estendendo em todas as direções! Nem precisaria a rigor me preocupar com a queda, pois simplesmente não havia lugar algum sobre o qual eu poderia cair! Era simplesmente um abismo azul-anil sem fundo!
    Olhei para cima. Apesar do caos, ainda reconhecia o lugar: era o meu bairro, as redondezas de minha casa... só que de ponta cabeça! Telhados não haviam sobrado mais em casa alguma! Na verdade, algumas das casas nem mais estavam lá, apenas seus alicerces. A explicação era óbvia: as suas fundações não eram sólidas o suficiente para mantê-las presas ao solo acima de mim e elas já haviam caído em direção ao abismo azul.
    Disse antes haver notado uma leveza incomum na escrivaninha que usei de apoio para acessar o teto térreo da casa, lembram? Pois bem, eu também estava mais leve, por isto não era tão difícil me manter suspenso no que restou do antigo telhado. E não que eu já tenha saltado do alto de uma casa muitas vezes em minha vida, mas a recente queda não me pareceu ter acontecido com a velocidade que sempre imaginei que uma queda teria. Sim, estava tudo mais leve, eu estava sendo puxado para baixo (ops! me perdoem a expressão errada: puxado para cima!). Com menos força que o normal, mas ainda assim estava sendo puxado! E mesmo que não fosse tão difícil me  agarrar ao madeiramento por bastante tempo devido à aparente diminuição do peso, o que me afligia era que o próprio madeiramento começava a ceder. E cedeu!!!
    Continuei caindo por minutos intermináveis naquele abismo cor de anil. O chão ficava cada vez mais distante, cada vez mais alto. Em poucos segundos vi todo o bairro. Alguns minutos depois, a cidade toda aparecia acima de mim. E o céu escurecia... Cada vez ficava mais difícil de se respirar. Quando já caía por uns cinco minutos o céu já estava praticamente preto, e o horizonte já apresentava uma certa curvatura de tão distante que já me encontrava do solo. Mas neste ponto o ar tornou-se tão rarefeito que fiquei inconsciente...
   Acordei engolindo água salgada. Felizmente consegui me agarrar em destroços de madeira boiando naquele mar desconhecido e inesperado para mim, depois de ter caído não sei por quantos minutos ou horas, não conseguia mais ter uma noção exata do tempo que levou. Foi bem fácil agarrar algum objeto boiando, pois haviam muitos! O ar continuava rarefeito, mas já era mais respirável. Consegui reunir bons pedaços de madeira e improvisar uma jangada. Tentei descansar um pouco antes de tentar compreender em que nova situação me encontrava, quais seriam as próximas surpresas.
    Olhei em direção ao horizonte mas descobri que não havia mais um horizonte, e sim dois! O primeiro era formado por este oceano que eu desconhecia, e no qual agora boiava. acima deste horizonte aparecia uma aura muito fina de um azul bastante pálido, mas que escurecia rapidamente à medida que se levantava o olhar. O céu se tornva então um completo breu, e bem no meio deste breu pude ver o sol, brilhante mas bastante estranho para mim, de um jeito que nunca havia visto antes. Olhando mais para cima o céu começava de novo a se tornar azul anil, contornando um segundo horizonte que agora percebia estar bastante curvado, e bem acima de minha cabeça reconheci parte do planeta terra, observada como Gagaring a teria visto algumas décadas atrás, de uma altura de algumas dezenas de quilômetros! A grande pergunta era: e eu!!! Que eu fazia lá??! Além disso, gagarin nunca havia mencionado um oceano de água salgada de onde ele tinha observado nosso planeta. E se bem estou lembrado, ele estava bem seguro dentro de uma câmara pressurizada orbitando o planeta, não ao ar livre e deitado de costas sobre uma jangada improvisada. E que ar era este??
    - Venha, rapaz!!! Suba a bordo!!

    Um iate?? Não havia mais dúvida alguma, eu havia enlouquecido completamente e este era o estágio mais avançado dos delírios.
    - Não vai embarcar? Asseguro que aqui dentro está muito mais confortável!
    - Mas que diabos de lugar é este aqui??? - perguntei àquele que, supunha, seria o capitão da embarcação.
    - Náo espere respostas, amigo. Todos aqui sabem tanto quanto você. Já é o décimo quinto que tento salvar do afogamento desde que acordei hoje de manhã.
    - Vão vir nos buscar aqui? Pediu alguma ajuda?
    O capitão aponta para cima, para nosso planeta azul.
    - Pedir ajuda para quem, filho? Para a NASA? - solta uma gargalhada, acompanhado pelo resto da tripulação. - Apenas suba aqui e se aqueça, pode ser? Depois podemos jogar conversa fora para tentar entender o que aconteceu...
    Todos a bordo tinham uma história muito parecida com a minha para contar: acordaram, viram tudo de ponta cabeça, tentaram sair de suas casas e, como eu, cairam no céu. Apenas o capitão parecia ter presenciado acordado o exato momento em que aconteceu o estranho evento:
    "Começava a amanhecer. Costumo acordar e ficar no convés do iate esperando pelo nascer do sol. Mas percebi que a maré começou a subir. Era estranho a maré subir naquele horário, pois sabia que estávamos no período de lua nova. Mas o fato é que, à media em que o sol começava a aparecer e subir no horizonte, também subia a maré. Estava no cais, mas já havia levantado ancora pois pretendia sair cedo para alto-mar. Porém o mar começou a ocupar tudo ao meu redor. Percebi que começava a cobrir as casas litorâneas. Havia alguma coisa muito errada, nunca tinha visto uma maré tão alta daquela forma! Foi quando aconteceu aquela coisa estranha: o iate começou a subir a linha do mar! Era como se ele estivesse ficando cada vez mais leve! Eu mesmo comecei a me sentir mais leve neste momento! E o sol sumiu! O céu já estava mais claro, só que a maré já havia subido tando que o sol ficou oculto debaixo da linha do horizonte. E o iate já estava tão alto em relação às águas abaixo dele que comecei a temer que ele fosse tombar. Mas não tombou. Na verdade a água toda em volta começou a ocupar todos os espaços, como se flutuasse. E de fato flutuava, como o iate também flutuava, como flutuavam todos os objetos dentro do iate e até eu mesmo futuava! Igual aqueles astronautas em suas naves, sabem? Só que não era uma nave espacial, era só minha humilde nave marítima...
    Por vários minutos foi uma confusão dos diabos!! Tentava me agarrar a qualquer coisa para não sair flutuando por aí, olhava à volta, tudo estava uma bagunça!  Muita água, mas não um mar. Eram várias bolotas de água flutuando por toda a parte, carros, telhados... em todas as direções para onde eu olhava. Até que comecei a me sentir caindo. Bem devagar, é verdade, mas estava caindo sem dúvida alguma. Não sei como, mas consegui entrar no iate neste momento. As águas começaram a se juntar de novo debaixo do iate, embora nesta hora eu já nem tivesse mais muita certeza do que estava encima e do que estaca embaixo. Mas foi gradual. QUando deu uma sete horas da manhã tomei coragem de sair de dentro do iate novamente e me deparei com isto que vocês estão vendo agora..."

Visão Trinocular

            Eu sei tudo o que se passa dentro de tua cabeça. Posso ver teu coração batendo dentro de teu peito. Não estou falando de teus pensamentos, nem de teus sentimentos. Não, eu não estou usando metáforas. Quando digo que vejo estas coisas, eu as vejo literalmente. É tudo questão de focalizar aquilo que quero observar.

            Se eu focalizo bem entre teus olhos posso ver tua massa encefálica com todas as suas reentrâncias, vejo o cerebelo, as paredes da tua cavidade nasal... Se desço meus olhos para o lado esquerdo de teu peito vejo o coração se enchendo de sangue para logo em seguida se contrair, num moto contínuo. Logo atrás dele observo teu pulmão se enchendo de ar, todos os teus alvéolos pulmonares se inchando em sincronia, teus vasos sanguíneos se subdividindo em capilares, liberando o gás carbônico e absorvendo o oxigênio para dar continuidade ao teu metabolismo.

            Parece um pesadelo? Uma visão de filme de terror? Nada disso! Eu vejo todas estas coisas desde que me conheço por gente. Para mim não é nada de extraordinário,nunca dei muita atenção ao fato de conseguir vê-las. Sempre achei que isto era normal, que todas as pessoas enxergavam estas coisas da mesma forma que eu. Faz exatamente um ano que descobri que esta minha habilidade era única, que as pessoas "normais" não enxergavam o mundo desta mesma forma.

            Eu posso ver o que existe dentro de cofres fechados sem abri-los, apesar de não poder pegar o que existe lá dentro. Até poderia abri-lo, caso estudasse um pouco mais sobre os mecanismos de sua fechadura: eu posso vê-los, talvez até descobrir seu segredo se me dedicasse a isto. Mas não tenho vocação para ladrão de cofres. Pode ficar seguro que apesar de poder, não vou fazê-lo. Suas riquezas estão bem protegidas.

            Consigo prever o futuro próximo. Mas não sou mago, nem cartomante, nem astrólogo... Não preciso de tais artifícios, o futuro eu simplesmente o vejo. Mas só o futuro próximo me parece claro. O futuro distante é nebuloso, e vai ficando cada vez mais nebuloso à medida que fica mais distante. É mais ou menos a diferença entre ver um objeto próximo a você e um objeto distante. Se o objeto é pequeno, não consigo vê-lo claramente quando ele começa a se distanciar muito. Se o objeto é grande, até consigo prevê-lo num futuro um pouco mais distante. Por exemplo, eu sei que vai chover daqui a meia hora. O evento é grande, céu nebuloso, água caindo, gente correndo procurando abrigo... É fácil para mim distingui-lo com uma certa antecedência. Mas não posso, por exemplo, ver que números sairão no próximo sorteio da loteria. O objeto é pequeno demais, consigo até prever os números poucos segundos antes deles serem anunciados. Mas não dá tempo de apostar neles. Se possível fosse, hoje eu estaria trilionário. Infelizmente não posso usar esta minha habilidade incomum para conseguir vantagem com este tipo de aposta.

            Você pode até dizer que prever o tempo nem seja grande coisa. Ainda mais se eu te digo que a minha previsão mais distante é para daqui a meia hora. Você diria que a meteorologia faz melhor, não é? Em termos... Tudo bem, a meteorologia prevê o tempo para daqui a uma semana, mas ela própria está sujeita a erros, e inclusive coloca em tal previsão qual é a probabilidade dela estar errada. Eu posso prever que vai cair uma tempestade daqui a meia hora. Concordo que não dá para comparar meia hora com uma semana. Mas existe uma grande diferença: minha previsão não tem probabilidade de erros como a previsão meteorológica. Ela é certeira! Se eu vejo que vai cair uma tempestade daqui a meia hora, ela certamente vai acontecer!

            Pode parecer bem estranho esta possibilidade de prever o futuro, não é? Eu também já queimei muito meus neurônios com isto, mas cheguei às minhas conclusões. Livre arbítrio não existe, é tudo ilusão! Ninguém decide nada, a ilusão de se estar decidindo alguma coisa simplesmente faz parte do processo. Lamento ter desapontado alguém com esta afirmação, mas nada posso fazer: eu vejo que as coisas são assim. Me dêem licença de exemplificar com uma situação bem banal: você está caminhando por uma trilha desconhecida e se depara com uma bifurcação. Para onde você decide seguir? Esquerda ou direita? Se eu estivesse acompanhando tal situação eu veria claramente que você vai seguir, digamos, para a esquerda. É inevitável, vai acontecer assim! Você vai pensar, ponderar porque seria melhor seguir para um lado e não para o outro, tirar a sorte numa moeda, etc... Não importa! Se eu vi que você vai seguir para a esquerda, tua conclusão final  de toda e qualquer elocubração que você fizer vai ser seguir para a esquerda. Mesmo que você conclua seguir pela direita, alguma coisa vai acontecer e te levar a efetivamente seguir a bifurcação da esquerda. É inevitável, isto faz parte do processo!

            O sonho de muitos visionários é viajar no tempo. Decidir alguma coisa hoje baseando-se em coisas previstas, algo que acabei de explicar que não pode ser feito. Ou então voltar para o passado para corrigir alguma erro. Fiquem tranqüilos todos aqueles preocupados com o paradoxo do filho que volta ao passado e mata o pai, e desta forma ele próprio nem poderia existir e muito menos matar o próprio pai. Fiquem calmos, tal paradoxo não existe! Não é possível viajar no tempo! Eu vejo isto! Nem diria que se trata de uma impossibilidade física. Não sou especialista nesta área, e não conseguiria apresentar argumentos plausíveis neste sentido. Digo a vocês que a impossibilidade é geométrica! É assim que a vejo. Viajar no tempo seria equivalente a tentar desenhar um polígono com dois ângulos, ou um poliedro de três faces. Não dá para fazer, por mais neurônios que você queime tentando.

            Me perdoem se eu pareço estar me gabando desta habilidade incomum. Não é esta a minha intenção. Na verdade, como disse ante, eu nem sabia que a tinha. Para mim, a maneira que eu via as coisas era a mesma que todo mundo via. Mas é fácil explicar a diferença, se você se permitir um vôo da imaginação. Normalmente temos dois olhos, não é? Por quê? Na natureza não há desperdício, não teríamos dois órgãos exatamente iguais no corpo se o fato de tê-los duplicado não apresentasse alguma vantagem, alguma capacidade adicional. E esta capacidade adicional existe: temos dois olhos para poder combinar suas imagens e enxergar a tridimensionalidade do mundo. Não existe nenhum outro motivo para tê-los, a não ser que o fato de que, por deles estarem ligeiramente afastados (afinal, dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço) é gerado um desvio de paralaxe que nosso cérebro interpreta como profundidade.

            Pois bem, segurem-se em suas cadeiras e sentem-se, caso já não o tenham feito. Tenho uma revelação para fazer. Eu tenho três olhos!!! Descobri isto recentemente, ao fazer uma ressonância magnética da cabeça! Mas aparentemente não sou nenhuma aberração: minha face tem dois olhos, exatamente como é o normal das pessoas normais. Meu terceiro olho está dentro de minha cabeça. E não pode ser descrito em coordenadas tridimensionais de nosso espaço, pois ele salta de nosso "plano" dimensional. Meu terceiro olho está pendurado numa quarta dimensão, e é isto que me permite ver dentro de você, dentro de um cofre ou ver dentro da misteriosa bola de cristal do futuro próximo. Pois acreditem, e isto eu vejo claramente: o tempo nada mais é que uma dimensão adicional.

            Demorou um pouco para eu descobrir a causa desta diferença, mas acabei descobrindo. Minha diferença está no DNA, na orientação da hélice do gene da opsina. É a responsável, entre outras coisas, pela morfogênese dos olhos dos mamíferos. É fato bem conhecido que a hélice do DNA, bem como as proteínas que ela sintetiza, são, de certa forma, "destros". O DNA de qualquer criatura deste planeta (ao menos é o único exemplo que conhecemos por enquanto) se enrola segundo a conhecida "regra da mão direita": se você apontar o polegar em sua direção, a hélice se enrola no sentido dos demais dedos, ou seja, anti-horário. Bem, nós somos resultado da combinação de duas partes de DNA, o de nosso pai e o de nossa mãe. Como ambos seguem esta "regra da mão direita", normalmente não existe problema nesta recombinação. Mas no meu caso foi diferente! O trecho de DNA de minha mãe responsável pela síntese da opsina, vai lá se saber o motivo, se enrolava segundo a regra da "mão esquerda"!! Quando este gene tentou parear com o correspondente de meu pai (que era normal, ou seja, "destro") ocorreu um pequeno salto do "plano tridimensional" normal durante a morfogênese. Acabei com um olho adicional na quarta dimensão!

            Vamos lá, como foi que descobri isto... Foi numa ressonância magnética. Descobri que eu não tinha a hipófise dentro de meu cérebro! Na verdade o ser humano (bem como os demais mamíferos) são "programados" geneticamente a terem um terceiro olho. Existiu a muito tempo um réptil, pré-dinossauros, que de fato o tinha. Mas durante a morfogênese este olho começa a se desenvolver dentro do cérebro, e isto reprograma a sua função e acaba transformando-o em hipófise.No meu caso foi diferente: a recombinação lhe deu espaço livre, na quarta dimensão, "fora" do centro do cérebro, para que ele se desenvolvesse normalmente como um terceiro olho.Felizmente não fiquei sem hipófise, ou pelo menos sem sua função: os tecidos vizinhos assumiram tal responsabilidade. Mas no exame de ressonância feita ficou bem evidente a existência de feixes nervosos indo e vindo de lugar nenhum! Quer dizer, iam e vinham de um lugar sim, meu terceiro olho, mas o equipamento de ressonância nunca foi projetado para prever esta dimensão a mais. Para ele existia um vazio no lugar de meu cérebro onde deveria estar a hipófise.

            É por isso que posso ver dentro de você, dentro de um cofre, e dentro desta caixa lacrada que chamamos de futuro. Eu vejo, tento explicar o que vejo, mas não consigo. Como explicar a um cego de nascença o que é verde, azul, amarelo...?  Não dá, isto está fora do conjunto de sensações que ele é capaz de perceber. Da mesma forma, eu também não consigo explicar o que é minha visão trinocular. Entendem meu dilema? Eu vejo as coisas assim, mas não consigo explicá-las para ninguém. Faltam parâmetros de comparação. Não posso explicar a um cego o que azul! Certo, sejamos menos drásticos: não posso explicar a um daltônico o que é verde! Nada existe na vivência dele que eu posso usar como comparação. Da mesma forma, eu não posso te explicar como é ver o mundo em quatro dimensões. Não sei, não existe o que eu possa usar de coisas percebidas por você que eu possa usar como comparação, como referência. Não sei te explicar isto.

            Mas é assim que as coisas se apresentam a mim....